sábado, 22 de maio de 2010

Responderão por tentativa de homicídio - Correio Braziliense linka nosso Blog

Os acusados de espancar um militar após ele ter pedido silêncio no posto da 214 Sul poderão pegar até 13 anos de prisão, caso condenados. A população reage à violência com um boicote ao estabelecimento

Luiz Calcagno

Publicação: 19/05/2010 08:02

A polícia teve acesso ontem ao laudo do Instituto de Medicina Legal (IML) que confirma as agressões sofridas pelo tenente da Aeronáutica Anísio Oliveira Lemos, 46 anos, espancado no sábado após reclamar do barulho a um grupo de rapazes no posto de combustíveis da 214 Sul. De posse do documento, o delegado titular da 1ª Delegacia de Polícia (Asa Sul), Watson Warmling, classificou a violência cometida contra o militar como tentativa de homicídio qualificado, por motivo fútil e sem dar chance de defesa à vítima. A pena é de 10 anos de prisão. Somado ao crime de dano ao bem público, os agressores, se condenados, podem pegar até 13 anos de detenção. Indignada, a comunidade da quadra faz protesto conclamando os motoristas a boicotar o estabelecimento.

Inicialmente, o bando seria indiciado por lesão corporal. O crime é grave quando incapacita a pessoa por mais de 30 dias. A expectativa na 1ª DP era de que, no caso de Anísio, a lesão fosse leve. A pena então iria variar de três meses a um ano de reclusão. Mas para o delegado, agora está claro que os autores “assumiram o risco de causar o evento morte”. “Os autores agrediram a vítima, perseguiram, derrubaram o militar no meio do Eixinho L Sul, continuaram com as agressões no gramado em frente ao Bloco K e seguiram com a violência no prédio. Um deles, que era lutador de jiu-jitsu, sufocou a vítima. Eles só pararam quando a mulher do agredido chegou”, explicou Warmling.

As buscas por outros três autores das agressões continuam. Respondem em liberdade pelos crimes, por enquanto, Daniel Benquerer Costa, 23 anos, gerente do estabelecimento e filho da proprietária do posto, e Edécio Borges, 22. O delegado Warmling pediu ainda que a população auxilie a polícia por meio de denúncia anônima. O telefone é 197.

Alvarás cassados

O espancamento de Anísio motivou a cassação de cerca de 11 mil alvarás de funcionamento temporários. A maioria das lojas de conveniência de postos do DF — como a do estabelecimento da 214 Sul — está incluída nessa lista. A Administração de Brasília informou, por meio da assessoria de imprensa, que o Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) determinou que o governo revogasse os documentos precários.

A administração vai elaborar uma lista a ser entregue à Agência de Fiscalização do DF (Agefis) para garantir que comércios irregulares sejam fechados. A Agefis se manifestou por meio de nota. Segundo o assessor Cláudio Caixeta, assim que o lojista for notificado, terá 30 dias para regularizar sua situação. Quem desobedecer terá o comércio interditado e levará multa entre R$ 500 e R$ 5 mil.

A população também resolveu agir. Há um forte movimento propondo o boicote ao posto de gasolina da 214 Sul. A ação se popularizou pela internet. Foi criado um blog (http://posto214sul.blogspot.com ) que sugere aos motoristas não abastecerem no estabelecimento, além de comunidades no site de relacionamentos Orkut e correntes de e-mail. Na manhã de ontem, um grupo de 20 moradores do Bloco K protestou em frente ao posto.

A mulher do militar agredido, Rosimeri Alves Lemos, 45, e o filho dele, Matheus Alves Lemos, 22, estiveram na manifestação. De acordo com Matheus, os pais estão recebendo apoio psicológico. A família aguarda o resultado de exames feitos no Hospital das Forças Armadas (HFA). “A vista do meu pai está comprometida e ele sente dores no ombro e no pescoço. Toda a família está emocionalmente abalada”, comentou.

Palavra de especialista

Barulho e estresse

“A questão da poluição sonora pode ser vista sob diversos ângulos. O problema da poluição em si, do ponto de vista da psicologia ambiental, é que o barulho é um dos maiores causadores de estresse humano. Não falo apenas do vizinho ou do problema com o posto de gasolina. Expor-se ao barulho constante de carros e ônibus é irritante. O bem-estar individual, a capacidade de produzir e de se concentrar fica prejudicada e até o relacionamento com o próximo é comprometido. Isso gera uma série de transtornos. No caso do militar, temos um fenômeno que não se restringe a barulhos, também temos um acúmulo de irritações. Existe um estudo de percepção de barulho em Brasília, que fala sobre o desamparo. É uma situação em que a pessoa sente que não adianta agir. Acontece que quando o problema é controlável, a pessoa reage de maneira diferente de quando tem a sensação de desamparo apreendido. O posto de gasolina, por exemplo, tinha como controlar o problema. Havia pessoas responsáveis pela poluição. Existem várias situações, algumas sem fim trágico, em que o vizinho reclama na casa ao lado. Ao que parece, o militar chegou a um ponto de estresse tamanho que ele resolveu ir lá pedir silêncio. Infelizmente, deu no que deu.”

Hartmut Günther, professor de psicologia social e ambiental da Universidade de Brasília (UnB)

Depoimento

Desabafo contra a impunidade

“A gente está passando da raiva à indignação. O que aconteceu não pode passar impune. Pedimos ajuda à polícia. Eu mesmo fui à 1ª Delegacia (Asa Sul), registrar ocorrência. Eu temia pela vida do meu filho, que já teve a mesma atitude do pai, de ir lá, pedir para baixarem o volume do som. Eles me ignoraram. A indignação que sinto é contra as pessoas, contra o Estado e contra a polícia. Nós somos inteligentes o suficiente para evitar o que aconteceu. Se meu marido está bem? Imagine um homem de 45 anos, pai de família, agredido por delinquentes. A moral vai lá embaixo. Eu não estou trabalhando, não estou dormindo à noite. Estou muito nervosa. A mãe não tem que dar um posto de gasolina para um filho, tem que dar um livro. Quero acreditar que a moral e a dignidade do meu marido serão resgatadas. Ele está com um dos olhos comprometidos. Quero acreditar na polícia. Quero acreditar que, agora, vai acontecer alguma coisa.”


Rosimeri Alves Lemos, mulher do militar agredido

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